Na
última semana, o suíço Julien Blanc foi notícia em vários jornais brasileiros.
O “instrutor de pegação” teve seu visto de entrada no país proibido pelo
Itamaraty. A mobilização surgiu a partir de uma petição na internet que pedia a
negação de seu visto e alcançou mais de 150 mil assinaturas. Julien ficou
famoso em vários países pelas palestras e vídeos da internet, onde ensina os
homens a “pegar mulher”, mas de uma forma violenta, machista e degradante. Depois do episódio no Brasil, Blanc foi barrado no Reino Unido também.
Foto: Julien Blanc ensinando a "pegar mulher" / Reprodução
O
caso recente de Julien Blanc ilustra bem os episódios de mobilização social que
surgem na internet. A versão brasileira do abaixo assinado atingiu mais de 400
mil nomes, quantidade mais que suficiente para impedir a entrada do "estuprador". Então, percebemos como o ciberativismo é capaz de ampliar a
participação política ou até mesmo estreitar a relação entre o Estado e a sociedade.
O termo Ciberativismo, segundo o sociólogo brasileiro Sérgio Amadeu, é um conjunto de
práticas em defesa de causas políticas, socioambientais, sociotecnológicas e
culturais, realizadas nas redes cibernéticas, principalmente na internet.
Foto: Manifestações de junho de 2013 / Reprodução / Ipanema Comunitária
E
agora você começa a se lembrar das petições públicas que assinou na rede, pedindo
para salvar as foquinhas no Alasca ou tirar Marco Feliciano do congresso. Muitos
dizem que esse tipo de ativismo criou um exército de engajados de
internet, mais conhecidos como "ativistas de sofá". São pessoas que demonstram forte
interesse por política, mas supostamente não vão às ruas, não saem da esfera digital - E aí, você se pergunta: esse tipo de mobilização é válido?
Foto: Foquinha no Alasca / Reprodução
Parando para analisar as
reais consequências de um protesto de rua e um documento online reivindicando
algo, o que se vê é que o ciberativismo tem mostrado resultados mais efetivos.
O filósofo francês Pierre Lévy concorda. Lévy disse em uma entrevista ao
Estadão que não é contra o "ativismo de sofá" e que a mobilização
online não é menos legítima do que as manifestações tradicionais de rua. Ele ainda afirmou que é necessário se investir na alfabetização
digital para elevar o nível de debate na internet.
Além
das petições online, o ciberativismo concentra um impacto forte nas redes
sociais, em comunidades e grupos organizados. Os protestos de junho de 2013
foram, em sua maioria, programados no Facebook, marcando um novo cenário
político da juventude brasileira. O ciberativismo está intrinsecamente ligado à
comunicação e às atividades da mídia.
Com o objetivo de exercer um papel
alternativo à imprensa tradicional, surgiu a Mídia Ninja (Narrativas
Independentes, Jornalismo e Ação), um grupo de ativismo sociopolítico que usa
as redes sociais, principalmente o Facebook para divulgar notícias. São
conhecidos pela estrutura descentralizada e pelas transmissões em fluxo de
vídeo em tempo real pela internet, usando câmeras de celulares e uma unidade
móvel montada em um carrinho de supermercado.
Organizadores da Mídia Ninja em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, em 05/08/2013
Também não
dá para falar de ciberativismo sem falar do Anonymous: é uma legião que
representa usuários de comunidades online que funcionam como um cérebro
global. Uma comunidade descentralizada e anônima que costuma atuar em torno de
um objetivo livremente combinado entre si e voltado principalmente a favor dos
direitos da população. Nas palavras deles mesmos, "nós somos uma ideia. Uma ideia que não pode ser contida, perseguida nem
aprisionada".
Foto: Bandeira do Anonymous / Reprodução
O Anonymous não é um grupo, não possuem líderes, nem ideologia: "Anonymous apenas pede que você se informe e busque informações por você mesmo, e apenas isto". A "ideia" surgiu em 2003 e nos últimos anos ficou cada vez mais conhecida pelo hacktivismo, colaborativo e internacional, realizando protestos e outras ações, muitas vezes com o objetivo de promover a liberdade na internet e a liberdade de expressão.
Mensagem do Anonymous para a população estadunidense
E
pra quem não sabe, o Hacker também é um tipo de ciberativista. A cultura hacker
consiste basicamente em defender uma maior transparência das informações
públicas na internet. Hackers são testadores de sistemas, manipuladores de
bits, e como tudo na vida, pode ser feito de forma benéfica ou não.
Muitos associam os hackers a algo malicioso e ameaçador, quando, na verdade, são eles
quem descobrem a vulnerabilidade de sistemas capazes de comprometer a segurança
de informação que neles contém.
Uma obra de ficção que mostra como
funcionam os sistemas de segurança e por consequência, os hackers, é Fortaleza
Digital, de Dan Brown. O livro tem uma narrativa que acontece na NSA (Agência
Nacional de Segurança), nos Estados Unidos, quando um ex-funcionário desenvolve
um algoritmo de encriptação inquebrável que nem o computador superpotente deles
consegue decodificar, algo considerado impossível. A história cheia de suspense
e mistério, característica do autor ajuda a compreender o universo dos sistemas
de segurança, como funcionam os processos de decodificação e o trabalho dos
serviços de informação do governo.
Foto: Fortaleza Digital, Dan Brown / Reprodução
Outra
obra célebre da ficção que mostra a ação hacker de forma mais fiel é a trilogia
Matrix. De acordo com a Folha de S. Paulo, os hackers se sentiram contemplados
com o segundo filme, por ser a produção cinematográfica que melhor retrata suas
ações. O filme provoca uma reflexão complexa não apenas sobre os sistemas de
computador, mas também sobre nossa percepção de realidade e existência. Neo, o
protagonista, é um pirata eletrônico que cria programas de realidade virtual
para uma empresa durante o dia e, à noite, ele invade programas e decifra
códigos.
Trailer do filme Matrix, de 1999
Marilena
Chauí, em seu livro “Convite à filosofia”, cria um paralelo entre Neo e
Sócrates, e com Matrix e a própria filosofia. Segue um pequeno trecho de sua
análise:
“Qual
é o poder da Matrix? Usar e controlar a inteligência humana para dominar o
mundo, criando uma realidade virtual ou falsa realidade na qual todos
acreditam. A Matrix é o feitiço virado contra o feiticeiro: criada pela inteligência
humana, a Matrix é inteligência virtual que destrói a inteligência que a criou
porque só subsiste sugando o sistema nervoso central dos humanos. Antes que a
palavra computador fosse usada correntemente, quando só havia as enormes
máquinas militares e de grandes empresas, falava-se em "cérebro
eletrônico". Por quê? Porque se tratava de um objeto técnico muito
diferente de todos até então conhecidos pela humanidade. De fato, os objetos
técnicos tradicionais ampliavam a força física dos seres humanos (o microscópio
e o telescópio aumentavam o limite dos olhos; o navio, o automóvel e o avião
aumentavam o alcance dos pés humanos; a alavanca, a polia, a chave de fenda, o
martelo aumentavam a força das mãos humanas; e assim por diante). Em
contrapartida, "o cérebro eletrônico" ou computador amplia e mesmo
substitui as capacidades mentais ou intelectuais dos seres humanos. A Matrix é
o computador gigantesco que escraviza os homens, usando a mente deles para
controlar as próprias percepções, sentimentos e pensamentos, fazendo-os crer
que o aparente é real”.
*Texto: Laís Matos
Revisão: Grupo 01
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