Um dia desses resolvi abrir o Youtube para ouvir algumas músicas de
bandas e cantores que gosto. Durante esse “zappear” de canal em canal, comecei
a encontrar vídeos aparentemente aleatórios e sem relação àquilo que procurei
anteriormente. Ao fim de algumas horas de navegação, pulando de canal em canal,
acabei em um vídeo de ursos pandas filhotes brincando entre si, com o cursor ao
lado aguardando o clique em um vídeo sobre o último debate presidencial.
Comecei a ter algumas certezas e centenas de dúvidas, e a primeira delas foi: o
quão ao acaso foi essa reviravolta de temas em um simples acesso à internet?
Um pouco perturbada, comecei a pesquisar alguns textos e cheguei ao termo
serendipidade, tão pouco conhecido quanto carregado de significado. A palavra
vem de uma antiga história sobre os três príncipes de Serendip que, durante uma
longa viagem, acabam fazendo descobertas interessantes e sem nenhuma relação
com o seu objetivo final. Ou seja: a serendipidade é encontrar onde não se esperava
aquilo que não se estava procurando – pelo menos não conscientemente. É virar
em uma rua diferente e encontrar uma casa antiga com filhotes de gato sendo
alimentados por uma velhinha com uma capa vermelha e uma cesta de pãezinhos de
queijo. É encontrar, ao lado dessa casa, um sebo com livros fantásticos e
fascinantes de páginas amareladas que você nunca tinha visto antes. É, dentro
dessa livraria, encontrar mais filhotes de gatos e... Enfim. Serendipidade é a arte
de encontrar o acaso.
E é uma arte, aparentemente, em fase de crise. O mundo globalizado e cada
vez mais conectado vem, gradativamente, sabotando as possibilidades de
encontrar o inesperado, principalmente quando se fala em meios virtuais.
Segundo o texto “Serendipidade – encontros com o acaso” de Bolívar Torres, e
como também já é sabido, todos os nossos dados e pesquisas ficam salvos. Quando
partimos para alguma pesquisa virtual, o próprio sistema pressupõe aquilo o que
queremos saber, baseados em pesquisas anteriores, e indica sites e fontes correlacionados,
funcionando como um “Gatekeeper” invisível.
Mas é preciso reconhecer que esse filtro invisível também tem as suas
vantagens, quando, por exemplo, é preciso fazer uma pesquisa rápida e objetiva
sobre determinado assunto para um trabalho acadêmico qualquer. Ninguém teria
paciência ou tempo para abrir dezenas de páginas sobre assuntos aleatórios,
como estabilizadores, quando o que você quer encontrar é um artigo sobre
comunicação de massa e teoria hipodérmica. O fator negativo é que esse filtro
invisível acaba tirando a nossa possibilidade de escolha: vamos direto à teoria
hipodérmica, sem poder, por conta própria, dizer não aos estabilizadores. O
sistema já diz isso por nós.
Foi depois de muito divagar que cheguei a esse questionamento: será que
todo o trajeto que fiz hoje pelo Youtube foi ao acaso, ou os vídeos já foram
sugeridos a partir de uma análise de tudo o que aparentemente me interessa? Para
mim, o Google e o Youtube me ajudaram a chegar onde estou, agora, neste
momento, com o cursor sob o vídeo do debate presidencial.
Depois de tanto me afligir e pensar em uma possível manipulação virtual,
acabei pesquisando sobre temas aos quais jamais tinha refletido antes. Afinal,
acho que por fim, acabei tendo um pouco de serendipidade, apenas por ter saído
do meu habitual rito na internet: redes sociais + música + filmes.
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