Wednesday, October 15, 2014

Em tempos de internet, Meras Coincidências não existem

Tudo começou quando o presidente dos Estados Unidos teve uma relação sexual com uma estudante adolescente. Até aí, para ele, parecia tudo bem – e até estava. O presidente era querido em todo o país e, em época de eleições, já estava praticamente reeleito, segundo as pesquisas. Até que em um belo dia o seu affair vazou para a imprensa, e, voilà, todos os jornais tinham como manchete “presidente abusa de adolescente”, e a sua vida e futuro político estavam destruídos por essa pequena, mas poderosa frase.

O filme Wag the Dog (Mera Coincidência, em português) dirigido por Barry Levinson e lançado em 1997, mostra um presidente desesperado com a iminente queda da sua popularidade às vésperas das eleições e um homem ansiando recompor a sua imagem e desmentir a verdade escancarada pelos jornais. É aí que entra Connie Bean, (Robert DeNiro) seu assessor, com uma ideia que pode ser a solução de todos os seus problemas: com a ajuda de um cineasta de Hollywood, Stanley Moss (Dustin Hoffman), a equipe do presidente resolve inventar uma guerra cinematográfica na Albânia, que só será resolvida graças ao glorioso presidente dos Estados Unidos. Ou seja: o presidente ganha uma guerra, vira um herói nacional, a sua imagem de criminoso sexual é esquecida e a reeleição está garantida.

Foto: Reprodução / Cartaz do filme em inglês

Com a já guerra criada começa toda a manipulação: o presidente faz discursos na televisão sobre o conflito, cenas abomináveis de pessoas mortas e depoimentos de vítimas rodam toda a imprensa norte-americana e o escândalo sexual é realmente deixado de lado por uma questão bem maior e mais interessante para a população. Uma das cenas mais marcantes do filme é o momento em que os produtores, dirigidos por Moss, criam uma situação em que uma jovem camponesa albanesa, interpretada por Kirsten Dunst, foge de bombas protegendo o seu gatinho com o corpo. Essas imagens foram ‘viralizadas’ nos Estados Unidos e toda a situação foi usada como campanha pelo candidato a reeleição.

Foto: Reprodução / Cena do filme em que mostra a veiculação da imagem da albanesa protegendo o seu gato

O filme foi um sucesso de bilheteria e recebeu duas nomeações ao Óscar, nas categorias de Melhor Ator (Dustin Hoffman) e Melhor Roteiro Adaptado. Também recebeu três nomeações ao Globo de Ouro, nas categorias de Melhor Filme, Melhor Ator (Dustin Hoffman) e Melhor Roteiro.

Trazendo o roteiro de Levinson para 2014, pode-se chegar a vários questionamentos e algumas conclusões: será que toda essa farsa criada pelo assessor do presidente e alimentada pela grande mídia de massa seria possível em tempos de fácil acesso à informação como hoje? Até que ponto seria possível uma manipulação tão perigosa – e fácil de ser desmascarada – perdurar a ponto de garantir que toda a população e a imprensa acredite?

É fato que a imprensa já foi um grande veículo de propaganda política em vários momentos históricos, no Brasil e no mundo. Para ilustrar, pode-se citar o programa de rádio do presidente Getúlio Vargas, Hora do Brasil, que foi transmitido entre 1930 e 1945. O programa foi uma das maiores plataformas de marketing do presidente durante o seu governo, onde falava de suas proezas e delatava todos os golpes e supostas mentiras de seus opositores. Não que, em 2014, um político não possa mais ter o seu próprio veículo de imprensa – é sabido que muitos têm, inclusive. A grande dificuldade hoje é manipular a informação sem que, mais tarde, alguém descubra e a sua imagem vá por água a baixo.

Foto: Reprodução / Logotipo atual do antigo "Hora do Brasil", que hoje é "A Voz do Brasil"

A internet veio não para despolarizar ou substituir as mass media (televisão, rádio e jornais impressos) no processo comunicacional, e sim como uma plataforma que pode (pode, e não necessariamente vai) dificultar a veiculação de informações falsas, partindo da premissa de que a internet é um meio livre e qualquer um pode desmentir dados. Na opinião desta jovem estudante de jornalismo que vos escreve, a história de Mera Coincidência seria hoje menos realizável do que há 15 anos, já que aquela menina albanesa de 15 anos poderia, em apenas um clique, desmentir toda a história em seu blog ou na sua página do Facebook.

Já que a história do presidente estadunidense e seu assessor Connie Bean está longe de se tornar realidade nos dias hoje, a única forma de viver toda essa emoção de uma falsa guerra na Albânia é vendo o filme. Como dizem, uma imagem vale mais do que mil palavras – então dá um play no trailer, e quem sabe, vê o filme depois.

Vídeo: Trailer do filme Wag the Dog

*Texto: Bruna Castelo Branco
*Revisão: Grupo 01

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